sexta-feira, 23 de março de 2012

O mundo, meu mundo e eu

Eu sempre quis ser super heroína ou presidente pra poder mudar o mundo. Coisa de criança, que quer o mundo inteiro ao mesmo tempo, ser modelo, atriz, cantora e veterinária quando crescer. E que tem pressa de crescer pra poder devorar o mundo.
Eu cresci. Viajei pelo mundo, e tive o prazer de ver que ele é tão grande e tão pequeno ao mesmo tempo. E que pessoas, ainda são pessoas. No mundo, todo mundo é estrangeiro e nativo.
Aprendi outras línguas, o que me deu a oportunidade de aprender tantas outras coisas e conhecer pessoas incríveis. Troquei o sonho de ser cantora (depois de várias aulas fracassadas de coral), pelo sonho de estudar moda e jornalismo, e fazer arte por aí do meu jeito, sem necessariamente ser considerada uma "artista famosa". Até por que, nem todo famoso é artista e muito menos nem todo artista é famoso.
Eu rodei o mundo e o mundo rodou minha cabeça. O mundo me mudou e eu continuo querendo mudar o mundo.

domingo, 18 de março de 2012

Quando...

Você pensa em largar tudo e virar hippie, mas se pega postando isso na internet. Tarde demais meu amigo, você já foi abduzido.

sábado, 17 de março de 2012

Rotina

Eu não tenho culpa de te achar lindo, charmoso e adorar a forma com que você me olha.
Eu só queria uma companhia sabe, alguém interessante pra sentar ao meu lado no ônibus e compartilhar um sorriso de canto de boca. Alguém que me dê vontade de acordar cedo para pegar o ônibus e ir para a escola só para vê-lo de longe, por que meus olhos já se acostumaram com a paisagem do trajeto, que antes eu achava tão bonita...
Eu não quero que você se apaixone por mim, pois eu sei que nunca vou me apaixonar por você. Mas já me apaixonei pela forma com que você dobra a barra da sua calça deixando ver um pedacinho da sua meia e os seus olhos meio puxadinhos quando você sorri. 
Também não preciso ser a sua motivação para ir pra aula cedo e nem a sua vontade de que o final de semana termine para me ver na segunda-feira. Eu sei que não valho o frio que faz lá fora pela manhã.
Eu só queria que você também me achasse bonita e interessante, só o suficiente para querer sentar ao meu lado na volta da escola de vez em quando para jogar conversa fora, e transformar esse sorriso lindo de canto de boca num sorriso de boca inteira. Sabe, te admirar virou hábito só pra quebrar a rotina.

Prum amor de anos inteiros


Eu te amo e sei que você me ama de uma forma que nunca mais poderei ser amada. Você já me deixou com frio na barriga quanto tantos outros, mas o dos outros já passou e o seu depois de tantas estações passou também, mas não passou despercebido. É que de tanto ter aquele olhar e aquele sorriso e aquele jeitinho de falar por perto, a gente acaba se acostumando e a barriga desembrulha. Eu ainda preciso me acostumar que no seu caso, é a paixão indo embora deixando espaço para o amor. Mas eu não quero que o seu passe assim. Eu bem que gostaria de te amar e ainda ter borboletas na barriga todos os dias com você, então, por favor, me abrace bem forte e me faça rir com as suas gracinhas. Faça meu coração disparar e as minhas pernas tremerem só de ver o seu nome piscando no meu celular. Ou ficar toda vermelha quando te ligo dando a desculpa de que queria saber se você chegou bem em casa ou se passou um bom dia. Eu só queria ouvir a sua voz.
Mas é que já faz quase um ano que eu te amo assim, só de longe. Eu ando sufocada pela saudade, então, por favor, me lembre do quão bom é te amar.
Eu sei que foi escolha minha estar aqui, tão distante, e foi também escolha nossa continuar juntos mesmo sabendo a falta que você ia me fazer. Sei também que o colar que você me deu é pra me lembrar de que você está sempre comigo e a nossa foto continua na minha mesinha de cabeceira olhando pra mim. É que agora, eu só preciso do seu abraço pra saber que valeu a pena. Eu não aguento mais ser o seu amor de verão enquanto você é meu amor de inverno, sem nem te ter aqui pra me esquentar. Eu quero te encontrar logo pra gente voltar a ser amor da mesma estação, aqui no frio da Europa ou no calor do Brasil. Por que aonde você está, até nos dias frios faz calor.

Se entregar

É como o ar que nós respiramos. Quando o inspiramos, passamos a ter dentro de nós algo que, mesmo que só por um segundo, pertenceu a outra pessoa, e quando o expiramos, deixamos partir também um pedaço da gente que nos fez viver por alguns instantes. 
É tudo uma grande troca, um grande ciclo. E enquanto houver ar nos nossos pulmões, a gente vai estar assim, escancarado pro mundo.

terça-feira, 13 de março de 2012

Chorar resolve

Pequena, entrava em prantos e escutava: "não chora não...", "ah, se você chorar eu choro também, para!", "chorar não vai resolver".
Choro sim! Meu motivo é bobo mas se me deu vontade de chorar ele não é mais tão bobo assim! E se você quiser chorar também, senta aí e vamos chorar juntos, por que pra rir eu tenho muitas companhias, mas na hora de chorar sempre me vejo sozinha...
Eu gosto do gosto doce que fico na boca quando choro muito, mas não da garganta ardendo quando não posso me esgoelar. Gosto de ficar com os olhinhos molhados de lágrimas, e acho que fico até mais bonita assim, com a luz certa eles brilham como pepitas de prata. Não gosto de ficar com os olhos cheios de lágrimas se não posso deixá-las escorrer pelo meu rosto, fazendo até cócegas, talvez numa tentativa de me arrancar um sorriso. Gosto dos cílios que se soltam quando as enxugo, me dando a chance de fazer um pedido. Gosto que elas pinguem nos meus lábios dando um sabor de mar.
Não gosto de chorar silenciosamente. Não gosto de chorar escondido. Se eu me escondo, é por que eu não quero que ninguém me interrompa, por que agora o que eu quero mesmo é chorar até soluçar, fazendo bastante barulho igual uma criança birrenta. Por que chorar resolve sim, mas só se for muito, até desidratar. 

Se conselho fosse bom

Eu acho que você está indo muito rápido com as coisas.
Já faz algum tempo que você e a Ana terminaram pela segunda ou milésima vez, e a briga foi feia. Mas outro dia numa bebedeira ela me confessou que ainda gosta de você. Ela nem se lembra que eu sei disso, mas também nem precisava ter me contado, eu já sabia. Nós somos melhores amigas há seis anos e nem isso impediu o orgulho dela de me esconder esse segredo, que na verdade nunca foi segredo pra mim, pois oras, eu a conheço bem e até um cego poderia perceber que ela ainda não te esqueceu.
Você também é o meu melhor amigo, te conheço bem há uns três ou quatro anos, quando vocês começaram a namorar pela primeira vez.
Foi inclusive por causa disso que eu conheci o Gu, o seu "brother", com quem eu namoro há dois anos. Pois é, vocês namoraram, terminaram, voltaram e terminaram de novo, pararam de se falar e eu continuei com ele. Continuei também sendo a melhor amiga da Ana e acabei virando a sua também, logo agora que você deixou de ser "o namorado da minha melhor amiga" e acabou ganhando o posto de "meu-melhor-amigo-ex-da-minha-melhor-amiga".
E o engraçado é que a gente começou a se aproximar quando você tentava reconquistá-la com a minha ajuda. Logo eu, que algum tempo antes presenciava o início do romance de vocês. E acho que a gente tava meio destinado a ser amigos, sabe, naquele mesmo dia em que nós nos conhecemos e eu fiquei bêbada, vomitando pra tudo quanto é lado e você rindo de mim. Quem diria que seria eu que te daria conselhos algum dia.
Pois você já a reconquistou, já a perdeu, e eu continuo tonta no meio dessa história toda. 
Ainda me lembro com saudade dos passeios de bicicleta, dos filmes e dos jantares de casal que a gente fazia, nós quatro, juntos. Os dois melhores amigos, namorando com as duas melhores amigas, formando os dois casais mais apaixonados e divertidos do mundo. Só era meio chato quando rolava alguma discussão de relacionamento no meio de um jantar, por que a intimidade de melhores amigos e namorados misturados nos permitia meter a colher em tudo.
Só que mesmo que agora vocês sejam um caso perdido, eu ouvi falar uma vez que algo em que não se passa nem um dia sem se pensar sobre, é alguma coisa que não se deve desistir. E isso me parece bem o caso de vocês.
Talvez essa teoria funcione mesmo só em filmes de Hollywood, por que acabei tendo que concordar com o que a Ana mesma me disse uma vez e que até ouvi outro dia em uma música na rádio: "Às vezes só amor não é suficiente".
Talvez não seja mesmo não. Mas quem sou eu pra dizer o que o amor é ou deixa de ser. Logo eu, tão jovem, sempre tão azarada com os meninos, a última das minhas amigas a beijar na boca. Eu é que dei sorte mesmo de, de repente, achar alguém tão azarado quanto eu e com o maior coração do mundo pra descobrir o amor junto comigo. Fora isso, eu não tenho nenhuma experiência com relacionamentos que valha a pena se falar sobre.
Eu não sei o que é preciso pra completar o amor, por que pra mim ele já parece muito e acho muito menosprezo falar que amor não adianta. Como assim, amor? 
O que eu sei é que de nada vale ter tudo se não se tem amor. E é nisso que você tá errando feio.
Eu sei que você sempre foi menino de namorar, e apesar de ficar com uma ou outra nas festas, você gostaria mesmo é de levar alguém pra almoçar na casa da sua avó nos domingos e ir ao cinema de mãos dadas.
E mesmo que tenha sido muito de repente que você começou a namorar com a Flávia, eu achei bom. Ela é um pouco mais velha que a gente, madura, estilosa e bonita. Ela é descolada, tem opinião e personalidade forte, e no pouco que conversei com ela, a achei super gente boa, e apreciei bastante o fato dela tratar tão bem os seus amigos. Ela gostava de você e era uma menina diferente das outras. Diferente até das que você costumava namorar. Diferente, principalmente, da Ana, que sempre implicou com seus amigos e com o fato de você fumar maconha. 
Eu sabia que você nunca gostou mesmo da Flávia. Não deu nem tempo dessa paixão virar amor. Você só estava tentando, mais uma vez, achar alguém pra chamar de meu bem e curar o seu coração partido. Eu sempre soube que você é meio carente, embora poucas pessoas o saibam. 
Mas ela te fez muito bem, principalmente nessa fase difícil que você tá passando na sua família e tudo mais. Ela foi sua companheira e dividiu um pouco da sua dor.
Só que mais surpreendente ainda foi o fim desse namoro. Depois de passar alguns dias sozinho na Bahia, você terminou com ela com a desculpa de que ela não ligava muito pra você. O erro dela foi ter sido exatamente o contrário daquilo que você menos gostava na sua ex. Ela não se importava de você ir pra festas com seus amigos e nunca deu piti por causa do seu "caretinha". 
Pra você, ela se importava de menos e a Ana se importava de mais. E você não queria nem um nem outro. Você queria alguém que se importasse sem pegar no pé, e eu acho que era exatamente isso o que a Flávia fazia. Mas nem isso te agradou. Por que na verdade nunca foi esse o problema.
Não passou nem um mês que você deixou a Flá e enquanto eu esperava que vocês voltassem, você começou a namorar com uma tal de Priscila, que tem uma tatuagem baranga, um piercing esquisito e coloca fotos no Facebook de biquini e decotão. 
A Flávia também tem lá suas fotos com as pernas e barriga de fora, mas com ela é diferente. Ela tem bom gosto e é tudo arte. A Priscila que é barangona e me desculpe, com uma cara de puta mesmo. Aquele cabelo oxigenado pra mim não cola.
Eu só queria mesmo que você desse um tempo pra você. Talvez a pessoa que você está esperando sempre esteve ao seu lado. Nem a Flávia, nem a Ana, e nem essa Pri aí. A Paulinha mesmo, que nunca quis nada sério com ninguém, mas acho que vocês dariam certo. Ela só precisa aprender a amar.
Enquanto isso, vocês poderiam continuar ficando sem compromisso, como sempre foi. Os dois de bobeira, com vontade de uma companhia, se ligam num sábado à tarde e se encontram na área de lazer do prédio dela pra fumar um, dar uns amassos e falar da vida. Só isso. Talvez seja tudo o que você precisa.

domingo, 11 de março de 2012

Cheira eu


Estou vivendo na França, o país dos perfumes, hospedada em uma família de acolha, e, assim que cheguei ganhei como presente um perfume Dior. Minha irmãzinha daqui, tem sete anos de idade e vai para a escola usando um perfume DKNY e o irmão, de dez, um Hugo Boss. Quando compro cosméticos em uma loja daqui, recebo uma sacola cheia de amostras grátis de perfumes de grandes marcas como Givenchy e Chanel, que deixo na minha bolsa e a cada dia saindo de casa, experimento uma.
Isso me fez pensar que perfumes sempre foram um caso meio complicado, desde a sua invenção, aqui mesmo na França, para disfarçar os maus odores da falta de banho. 
Existe perfume ''de velho'', de criança, perfume de loja, e até aqueles que dão ''vontade de comer''. A dosagem sempre me deixou em dúvida. Uma vez ouvi falar que a medida ideal de perfume é aquela que se sente quando se cumprimenta a pessoa com um beijo. Eu concordo, mas às vezes acho uma delicia quando alguém medidamente cheiroso passa perto de mim e o perfume bate como uma brisa. 
Essa coisa de exagerar no perfume também é capaz de transformar qualquer fragância francesa em lixo. Uma vez fui dividir um taxi com um cara que usava um perfume gostoso, mas ele tinha exagerado tanto na dose que fiquei até tonta dentro do carro, saí de lá sem nunca mais querer ver um perfume na vida. Pra mim, perfume é que nem remédio. Na dose certa, faz muito bem, mas se exagerar, é uma droga. Mas o maior dilema é: o perfume deve ser uma identidade ou deve expressar nosso humor? 
Todo mundo tem uma tia-avó que só usa Chanel 5, ou vizinha que é conhecida pelo perfume. Aquele cheirinho já trás as lembranças da infância ou quando se entra no elevador, sabe que ela passou por lá. O perfume que a gente usa acaba virando o "nosso cheiro", e adoro quando empresto uma roupa pra uma amiga e ela me devolve dizendo que ficou sentindo meu cheirinho. É tão bom ter essa coisa tão íntima, tão nossa, tão natural, que é o nosso cheiro. Mas ao mesmo tempo gosto de variar de perfumes. São tantos bons, que eu não posso me prender só a um! Quando saio à noite pra uma festa, coloco aquele que é bem doce e feminino, forte demais pra usar de dia. No verão, gosto daquele de frutas que dá uma sensação de frescor, e pra sair com meu namorado eu coloco o que ele mais gosta, que ele, com sua típica delicadeza masculina, diz ter "cheiro de mato". Moschino, ok? Esse mato aqui é um Moschino carérrimo!! Mas eu detesto quando me perguntam o perfume que estou usando. Dizem que a cópia é o melhor elogio, mas pra mim, não há invasão e ofensa maior que imitar o meu perfume. Não fui eu que inventei, mas agora é o meu cheiro. Copiar esmalte ou comprar um vestido igual, ainda vai, mas imitar perfume é quase um roubo de identidade. Confesso que já comprei perfumes que conheci por causa de amigas, mas fiz isso anos depois que eles me foram apresentados e mesmo assim não consigo usá-los sem pensar nelas. Mas agora, quando me perguntam o nome do meu perfume, eu digo: "não sei, deve ser o sabonete mesmo". 

sábado, 10 de março de 2012

Que nem férias de verão

Intercâmbio é que nem férias de verão.
A gente espera por elas o ano inteiro, e tudo o que se faz durante certo tempo tem esse único objetivo.
Às vezes parece que a hora nunca vai chegar, mas sempre chega... E quando a gente vê que tá chegando, fica cada vez mais animado, fazendo mil planos, mas também com um certo aperto no peito de deixar ir embora uma fase que sabemos que passou.
Quando realmente começa, tudo parece tão interessante, são tantas coisas legais pra se fazer! Mas depois a gente comeca a enjoar, e fica doido pra voltarem as aulas pra poder usar o material novo, reencontrar os amigos, e ver o que tem de novidade na escola. Agora, de novo, é tudo divertido, mas depois de alguns meses, tudo o que precisamos são as nossas férias de verão de volta, que sempre achamos não ter aproveitado o suficiente...

É, acho que tudo na vida são férias de verão.

Não foi engano


Era manhã de terça-feira, e os alunos do primeiro ano estavam tendo aula de Português. A professora chamava a atenção de alguns bagunceiros e de outros que se dispersavam. Ela acabara de recolher o celular de uma garota que enviava mensagens. Um outro aluno teve seu Ipod enviado à diretoria, e só o teria de volta com a comunicação dos pais. A regra da escola é clara: nada de aparelhos eletrônicos em horário de aula.
A professora dava um longo sermão na menina negligente, quando foi interrompida por um barulho bem familiar: "Triiiim, triiiiiiiiim", seguido de uma música infantil.
A professora, que já havia perdido a paciência, deu um berro:
- Que brincadeira é essa?! Acabo de falar sobre a falta de respeito que é o uso de aparelhos eletrônicos durante a aula e vocês fazem essa gracinha? O engraçadinho responsável por essa brincadeira de mal gosto irá direto para a diretoria!
Todos os alunos se entreolharam desconfiados. A professora se dirigiu a Joãozinho, o mais atentado da classe.
- Não fui eu não, "fessora"...
Virou-se então para Marcos, mas ele já havia tido o celular recolhido na aula de História. Mariazinha, meio desconcertada, então revela:
- Professora, o barulho vem da sua bolsa...
- Como é, Maria Luz? Como pode me acusar disso? Meu celular está desligado, e eu jamais colocaria uma música infantil como meu toque!
Todos fizeram silêncio e se viraram para a bolsa da professora, que estava em cima da mesa.
 "Triiiiiiiiiiiim! Triiiiiiiiiiiiiiiiim! Patati patatatá vaaamos brincaaar quá quá quá êêê"
O silêncio da turma, contrastado com aquele som, formavam uma sinfonia perturbadora para a professora, que começou a desconfiar, contrariada, de que Mariazinha estava certa.
Foi então, cautelosa em direção à bolsa e a abriu intrigada. Tirou lá de dentro o aparelho celular responsável por aquele escândalo.
- Mas este não é o meu celular! E-e-eu não sei de onde ele surgiu! - Desesperou-se a professora.
Os alunos mantiveram aquele silêncio constrangedor e agora se olhavam assustados, estranhando aquela situação com a professora, que sempre se mostrou tão séria.
Ela tomou coragem e atendeu o telefone.
- A-a-alô?
Do outro lado da linha, um homem, de voz bonita e máscula. Ele dizia ter perdido seu celular e estava ligando para ver se o encontrava.
- Você é do hospital?
- Não.
- Você esteve na festa junina do clube da cidade?
- Não. Eu não estive no hospital e não fui à festa junina nenhuma apesar de ter uma queda por médicos e adorar quadrilha. Eu sou uma simples professora confusa! - desabafou, já muito abalada com aquela desconfortável situação.
- Aaah! Você dá aula no colégio EscoLar, e almoça no restaurante Abobrinha, que fica perto de lá?
- Aham.
- Ah! Eu me lembro de você! Devemos ter trocado os aparelhos celulares no balcão. Eu estava tão distraído com os seus olhos...
Nesse momento o sinal já havia disparado e os alunos já haviam saído da sala, pé ante pé para não atrapalhar aquele momento mágico, e a professora, sem ver o tempo passar, continuou na linha com o homem, numa conversa que durou horas...
Eles falavam sobre arte, política, astronomia... Ela revelou que se não fosse professora gostaria de ser pediatra. Ele, médico do hospital e filho de poeta. “Que bela contradição”, ela pensava...
- Pena que não combinamos muito quando se trata de gosto musical, não? Você não acha que já está bem crescidinho para ouvir musicas infantis?
- Ah, que vergonha! Você se refere ao toque do meu celular? Minha sobrinha que colocou aquela música... crianças, sabe como é, né? Hoje em dia elas sabem mexer em tudo!
A professora calou-se... seu sonho era ter filhos!
Seu pensamento foi interrompido quando se lembrou:
- Ei! Você que me ligou, do meu telefone! Minha conta vai ser arrasadora!
- Então, posso te pagar um jantar para compensar pela conta? Assim poderemos destrocar os telefones...

Comer, Rezar, Amar


Papai reunia todas as noites mamãe, meu irmão e eu na sala de jantar, em um ritual em que o alimento não era mais o personagem principal.
Ele, que foi criado em torno da mesa, fazia questão de tudo como antigamente: toalha posta, todos presentes no horário exato, de mãos lavadas e banho tomado. Se possível, todos os deveres de casa e atividades já deveriam estar concluídos. Esta era a cerimônia de encerramento do dia.
Cada um se sentava em sua respectiva cadeira, que, ao contrário de todo o ritual carinhosamente planejado por papai, foi demarcada naturalmente ao decorrer dos anos em que este ato acontecia diariamente.
Quando chegava, papai abençoava nosso lar com os dizeres: “Que a paz esteja nesta casa e em todos que nela habitam”. Quando não vínhamos correndo abraçá-lo dizendo "Amém", provavelmente por que estávamos entretidos demais com o computador ou televisão, anunciava: “Cristina! Gabriel! Isabel! O jantar ‘tá’ na mesa!”
É claro que estava.
Nos dirigíamos à sala de jantar, e, já postos à mesa, papai mais uma vez nos bendizia, com preces que variavam com a ocasião. Às vezes, em sua oração, honrava a presença de algum convidado, ou comemorava alguma conquista, mas sempre agradecia pelo alimento e pela união de nossa família.
Eu postava minhas mãozinhas frente ao peito em posição de prece, e rezava em voz alta: “Obrigada meu Deus, por esta comidinha tão gostosa, Amém”. Meu irmão, sempre implicante, dizia: “Você não comeu ainda, como sabe que está gostosa?”, o que me obrigou a mudar um pouco minha oração. “Obrigada meu Deus, por esta comidinha que parece estar tão gostosa”.
Finalmente podíamos devorar aquele jantar maravilhoso, e os assuntos, ao contrário de como nos velhos filmes do Poderoso Chefão, não eram limitados. Podia-se falar de negócios, dinheiro, tudo. Foi, inclusive, em uma dessas refeições que descobri que nasci de uma sementinha que papai havia colocado no pão que mamãe comia no café da manhã...
Papai, que comia muito e devagar, fazia questão que todos lhe fizessem companhia enquanto terminava sua refeição. E depois do jantar ainda havia um cafezinho e um pedaço de bolo como saideira. Não entendemos até hoje como era possível comer tanto!
Tendo papai terminado, nos levantávamos da mesa, escovávamos os dentes, nos despedíamos e íamos dormir.
Deitada, sempre com papai ao meu lado, que fazia questão de me botar para dormir todos os dias, rezava o Pai Nosso, ensinada por ele, a oração do anjinho da guarda, ensinada por mamãe, e o Ave Maria, ensinada por vovó. Estas eram as únicas orações que eu sabia e já pareciam suficientes para me manter protegida. E, ao fechar os olhinhos, mais uma vez agradecia, bem no fundo de mim: “Obrigada meu Deus, por esta família tão especial...”

Empreendedores da Alegria


Um grupo de jovens que saem por aí fantasiados de princesa, palhaço, vovó, e qualquer outra coisa que der na cabeça. Eles cantam, brincam, fazem travessuras, e usam uma camiseta colorida que lembra uniforme de escola infantil.
Com eles, uma abóbora vira a história da Coca e a fila do lanche, a brincadeira da serpente. Cada um com seus talentos e personalidade, causam admiração, e arrancam sorrisos e olhares curiosos por onde passam.
Seria um grupo de teatro? Uma trupe de circo? Ou só o Carnaval que chegou mais cedo?
Eu diria um pouco de cada, e muito mais.
Nós somos adolescentes que em meio à uma semana recheada de aulas e trabalhos de Logístisca, Contabilidade e Gestão, separamos um tempinho para inventirmos no nosso maior bem: as pessoas.
Por que a gente sabe que de nada adianta nos tornarmos grandes empresários, advogados ou engenheiros, se não formos acrescentar nada à sociedade além de números.
Em nossos encontros, desenvolvemos nossa capacidade de organização, espírito de equipe e liderança. Ou seja, mais uma vez botamos em prática, e de forma divertida, tudo o que aprendemos em sala de aula.
Nos aproximamos e criamos laços com professores e outros alunos que normalmente não teríamos a oportunidade, trabalhamos nossa desenvoltura, criatividade, e deixamos de lado a correria, a timidez, e todos os outros problemas por um bem maior e comum.
E apesar de oferecer tanto àqueles que precisam, nós ganhamos mais do que ninguém. Adquirimos aprendizados que não se vê nos livros, amigos, e nos divertimos como crianças. Ganhamos sorrisos sinceros e o sonho de uma sociedade melhor e mais humana.
É por isso que eu tenho tanto orgulho de vestir essa camisa.



Esfriou

Férias de Julho: é inverno, mas faz calor. O sol entra pelas janelas e o céu azul chama pra sair. Me deu vontade de ir ao clube.
Uma vontade como um daqueles sonhos bons, que a gente não consegue lembrar e acorda se perguntando se aquilo realmente aconteceu.
Não era vontade de nadar ou me bronzear. Era vontade de ligar para as amigas de manhã para marcar o sol da tarde, ficar fofocando na piscina, me arrumar toda só pra ir ao clube, comprar o sorvete caprichado do Bahiano, e depois ainda ir pro bar lá perto que vende açaí, pra ficar deitada nos "pufs" enquanto planejava o cinema da noite com as amigas, com os lábios roxos daquela delícia, que vinha acompanhado de morango, mel e granola, num pote bem grande de 500 ml.
Quando não voltava para a casa já de noite, morrendo de frio, com os cabelos molhados depois de nada à luz da lua, e as bochechas vermelhas, coradas de sol, eu voltava no final da tarde, esquentava o resto do almoço com a barriga pra dentro de fome enquanto assistia Malhação.
Cheguei no clube, o sol era o mesmo, e o céu azul também, mas não encontrei muito mais que algumas senhoras fazendo hidroginástica enquanto o moço limpava a outra piscina. 
O bar do açaí fechou e virou um escritório, as amigas estão estudando pro vestibular, o novo elenco de Malhação é uma bosta, e o sorvete do Bahiano agora custa dois e cinquenta. 
É, o inverno começou.

TPV: Tensão pré-viagem

De-te-s-to esse estresse pré-viagem.
A confusão começa no momento em que se pensa pra onde ir. Quando o destino é obrigatório, mais fácil. Aí tem que pensar em comprar as passagens, planejar a data, senão, olhar a estadia. Começam as economias: não se faz e não se pensa em mais nada que não seja a viagem. Se for internacional, pior ainda: quanta burocracia! É passaporte, visto, autorização pra isso, pra aquilo... 
Tomar vacina, fazer exames, e de quebra uma limpeza odontológica só pra garantir. Isso tudo pra não dar um pipiripaque "nas gringas".
Fazem parte do processo as compras: se vai pra praia compra biquíni, creme bronzeador, e um pacote na academia pra chegar saradona no verão. Se for pro Ski, tôca, luva, e até meia especial, que custam uma fortuna e a gente nunca mais usa.
Chegou a hora de arrumar a mala. Se tem lista de sugestões, ela só atrapalha: "Até parece que eu só vou usar isso! Lista ridícula!". Bota coisa, tira coisa, e acaba levando a casa inteira dentro da mala. Sem contar com a sensação que te incomoda até o fim te dizendo que tá esquecendo alguma coisa, e, realmente: chegando lá descobre que esqueceu a roupa de banho nova e a escova de dentes.
Na hora de partir, aquela correria! Enfia a mala no carro, coloca as tralhas em vinte posições diferentes até caber. Leva o cachorro pra casa da tia, entrega o papagaio pro vizinho, e dá comida pro peixe suficiente pra quinze dias.
Prepara o sanduíche (ou a farofa) pra comer no caminho, dá uma limpeza na geladeira, e pras donas de casa mais sistemáticas, rola até uma faxina.
Aí todo mundo resolve tomar banho na mesma hora ou senão sempre tem um que atrasa.
"Ai, nós vamos perder o vôo, o ônibus, vamos pegar engarrafamento na estrada!!!". Sim, por que pra quem vai de carro tem que partir antes de o sol nascer!
Mas se você vai de avião, também, por que a ida ao aeroporto, que fica onde Judas perdeu as botas, já é uma viagem em si. E, fora as horas na fila do check-in e do trajeto, tem que esperar de duas a quatro horas pro vôo. Isso se você der sorte da sua companhia aérea seguir a mesma ética de antecedência que eles cobram de você.
Pega fila daqui, dali, corredores imensos, e detectores de metais que apitam até com o zíper da calça.
A poltrona do avião parece ter sido feita pra deixar a sua bunda quadrada, a comida parece de hospital, e o seu vizinho de assento ronca. Não tem problema, você não conseguiria mesmo dormir com suas pernas formigando e o seu tímpano quase explodindo por causa da pressão do vôo.
No carro, sua irmã mais nova vomita ao seu lado enquanto seu irmão recita trava-línguas cuspindo farofa. O CD que sua mãe coloca é até bom, mas depois de rodar oito vezes, pois foi o único que ela levou, você passa todas as suas férias se sentindo nos anos oitenta e sabendo todas as músicas de cór. 
No destino, se ninguém pegar uma insolação ou passar mal por causa da comida bizarra, fora as brigas com seus irmãos e o caldo que você levou na frente daquele gato, tudo corre bem.
Na volta, tudo mais ou menos igual à ida, fora o peixe que morreu de fome, o cachorro que fugiu da casa da tia, e o papagaio que voltou imitando o Faustão.
Ufa! Acho que vou precisar de férias dessas férias.