Mãe,
A culpa é sua. A culpa é sua de eu ser emburrada e mal humorada. A culpa é sua de eu ter essa mania de fazer barulhinhos com os dedos encaixando uns nos outros de um jeito que só nós duas sabemos fazer. A culpa é sua, da forma que repouso as mãos sobre a boca e as vezes puxo um pouco dos lábios com as pontinhas dos dedos. A culpa é sua de sempre te ver nas minhas própias fotos e todas as vezes que me olho no espelho. Eu, que sempre me achei mais parecida com papai, venho me achando cada vez mais igual à você de uns meses pra cá. Embora você e Gabriel sempre fiquem rindo de mim dizendo que eu fui adotada e o Grilo me dizendo que eu sou a "Cristina branca". Iguaizinhas. Só muda a cor da pele. Pretinha!
A culpa é sua de eu ser horrível em Matemática e querer estudar Jornalismo mesmo não sendo "a profissão do futuro". A culpa é sua, se eu tenho uma visão crítica irritante sobre tudo, e sempre passo por chata ou louca perto desse bando de gente ignorante à minha volta. A culpa é sua se agora tenho birra de camisetas com estampas escritas em inglês e sempre questiono os desenhos e escritos nas camisetas de todo mundo. Aliás, a culpa é sua se agora só uso camisetas brancas e aceito pagar o que for em qualquer camiseta estampada que me agrade. A culpa é sua se eu sempre corto as etiquetas e faço "mudanças" em tudo quanto é roupa minha e acabo arrependendo. A culpa é sua, e um pouquinho de Gabriel, do meu jeito estranho de rir. Aliás, a culpa é sempre de Gabriel, que vive colocando a culpa em mim. Mas a principal culpa sempre foi sua. Sua e de papai, de me ter tido e ter tido Gabriel antes de mim.
A culpa das minhas sombrancelhas grossas é sua, e a culpa do meu nariz é de papai. Aliás, nariz que nunca achei bonito, e que você insiste em chamar de “nariz de Paganinho”. A culpa da minha altura é dele também - ainda bem! Você é muito baixinha! - mas a culpa das coxas sempre foi sua! A culpa é sua, de papai, de Gabriel, mas eu gostaria de ter um pouquinho de culpa também. Queria ter um pouquinho de culpa sobre mim mesma. Mas não tem problema. Eu amo que sejam vocês os culpados. Os culpados das minhas qualidades, dos meus defeitos, das minhas características em si, os culpados pela minha vida, os culpados da minha vida. A culpa é sua, mamãe, sempre foi e sempre será. Por que ser mãe é assumir a culpa. (E ser filha é ser eternamente vítima e cúmplice, mas nunca dona do próprio nariz!).
Bebel
*carta que escrevi à minha mãe em um surto de saudade em 2012, quando fiquei um ano sem vê-la.
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